sábado, 23 de outubro de 2010

Já repararam que...

...nossos comentaristas andam cabisbaixos, longe da empolgação do ano passado, com o "Brasileirão" corrente? O bizarro é que trata-se de um certame exatamente igual ao pregresso, aquele que foi vendido como "o maior de todos os tempos", "emocionante", e tal, por esses mesmos que agora quase choram ou bocejam no ar: times que caem de produção no segundo turno, equipe que surge e atropela rumo à liderança, disputa entre várias agremiações na zona do rebaixamento... Será por quê, um ano tão borocoxô por parte dos cronistas? Arrisco duas hipóteses:

1a.) Em 2009, eles precisavam levantar a Copa do Mundo vindoura, instaurar um clima de encanto crescente com o futebol até o ano seguinte - mas a "revolução tática" negativa promovida pela Espanha campeã (a do cozimento infernal dos toques laterais no meio-campo, e, de 1 a 0 em 1 a 0, o pragmatismo levado às últimas consequências possíveis e imagináveis) foi um tal banho de água fria que não conseguiram segurar a onda: sim, pessoas, o esporte está em franca decadência técnica nos gramados mundo afora, e é imperativa a admissão de tal fato. Ainda não puderam acordar em definitivo, pois possuem compromissos comerciais/corporativos que não os permitem chutar o balde com veemência (ao menos, aqueles dos quais esperamos atitude semelhante - da maioria, a passividade é eterna e sorridente companheira), mas estão em estado vegetativo, prestes a sair do coma.

2a.) Além da questão Copa, o campeonato ter sido hipervalorizado em função do Flamengo ser o clube com a maior torcida do Brasil (olhe que casamento perfeito, coincidência ou não: antes do certame mundial, para o congraçamento das massas na usual "corrente pra frente", nosso time mais querido é campeão!). A questão comercial tornou-se preponderante para as emissoras, que assim buscavam elevar suas audiências e lucros ao venderem essa ascensão rubro-negra como algo sem precedentes. Este ano, com a queda corinthiana, foi-se a única possibilidade das TVs em mascarar ao menos o mínimo do horror deste torneio nacional pós-ressaca do "fracasso" (em todos os sentidos) da Copa de 2010.

Fica aqui, então, a nossa dica: rapaziada dos microfones, enterrem logo o defunto, antes que ele enterre vocês.

domingo, 17 de outubro de 2010

Beijim beijim, tchau tchau

Parece que foi de um dia para o outro que as mudanças tomaram o futebol de assalto, mas não foi. Desde a época de João Havelange no poder de sua entidade máxima, a FIFA, na década de 70, já se ensaiavam diversas mudanças que tomariam corpo definitivo na gestão Blatter, no final dos anos 90, para fazer do esporte uma máquina global de render dinheiro, acima de tudo. As bases já vem lá de longe - mas, mesmo neste mundo onde tudo precisa ser moderno, padronizado e lucrativo, certas práticas não caem em desuso entre os "boleiros", por mais que sejam consideradas desatualizadas, ultrapassadas, fora de moda, etc. Porém, como o entorno que cerca os atletas é radicalmente diferente, a maneira como tais atitudes serão recebidas também. E isso pode representar muito mais do que aparenta em dois ou três segundos de um VT de melhores momentos.

Sábado passado, Robinho fez seu primeiro gol pelo Milan. O ex-santista, que tem oscilado entre o time titular e o banco de reservas (de onde saiu nesta última partida), depois de anotar o ponto, foi até um ponto no qual poderia encarar a torcida que o criticava no início da temporada, e também ser fartamente fotografado e filmado pela mídia ali presente, e beijou a camisa do time. Não só precisava dar uma satisfação aos que o criticavam, como também mostrar que ainda pode existir amor à uma camisa nesse mundo canalha, vaidoso e inclemente do futebol moderno, que já o queria vitimar antes mesmo de poder desenvolver seus primeiros seis meses de trabalho por lá. Vindo de qualquer um, já soaria cínico... De Robinho, então, é praticamente uma afronta, até mesmo para quem não é torcedor do Milan.

Não se pode precisar quando surgiu essa atitude de beijar a camisa (eu, pelo menos, não sei), mas ela servia para aproximar o jogador do torcedor. Pessoalmente, acho que nessa tão propalada história de amor à camisa tem muita balela (com dignas exceções, claro, e essas podemos contar nos dedos); mas o ato de mandar um singelo ósculo ao escudo da agremiação ajudava a dizer aos que pagaram ingresso que o jogador é consciente de ser apenas um intermediário entre o clube o torcedor, nada além ou acima disso. É necessário respeito e grande dose de discernimento, antes de tudo, pois é fácil desmascarar o farsante nessa brincadeira; já que todo jogador possui um passado, é acompanhado incessantemente pela mídia, diz coisas que podem ser mal interpretadas, etc. Se tal ato hoje é mal visto, se existe, por exemplo a expectativa do iminente vexame se um jogador beijar o símbolo no novo clube em sua apresentação, por exemplo, é porque isso é demonstração de frontal hipocrisia - não porque não existe mais o tal "amor à camisa", e sim porque o compromisso com o futebol fica em segundo plano para as novas gerações, mais interessadas em ascenção social, celebridade, etc. Assim, o que dizer se é um dos que mais valorizam o culto à personalidade a origem de tal prática?

Robinho está acuado neste início de temporada na equipe rossonera. Tanto a torcida quanto seus companheiros não lhe dão colher de chá. Sem o tão benfazejo refresco do paternalismo, aquele que tem feito os atletas retornarem ao Brasil reclamando de "perseguições" dos técnicos estrangeiros, tem cortado um dobrado. Na comemoração do gol, o atacante comportou-se feito um cordeirinho, quase chorando frente à organizada do Milan, rebaixou-se como poucas vezes pudemos ver, porque ainda quer de qualquer forma ser aceito em um dos "grandes" do Velho Mundo, mesmo com a carreira já em curva descendente. Fez média com a torcida, sequer preocupou-se em considerarem sua atitude populista (pelo contrário, quis que a registrassem, a fez ali, perto de quem a captasse para retransmiti-la depois), porque realmente não se incomoda, pois, sim, ainda acalenta o projeto de ser o "melhor do mundo". Por qualquer lado que observemos, não importa quantas voltas dermos, com Robinho sempre cairemos no individualismo, no personalismo exacerbado, na falsa humildade. Um beijo na camisa é para ele a continuidade desse processo de contínua adoração ao próprio umbigo - e que a trégua com os torcedores do Milan, que não iam com sua cara, venha seguida também de idolatria, é só o que a ele interessa. Durma-se com um barulho desses.